segunda-feira, 19 de maio de 2014

Poesia de João pessoa :presságio

                                      Presságio
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar pra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente…
Cala: parece esquecer…
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar…

Poesia de Manuel bandeira o homem e a morte


O HOMEM E A MORTE

O homem já estava deitado

Dentro da noite sem cor.

Ia adormecendo, e nisto

À porta um golpe soou.

Não era pancada forte.

Contudo, ele se assustou,

Pois nela uma qualquer coisa

De pressago adivinhou.

Levantou-se e junto à porta

- Quem bate? Ele perguntou.

- Sou eu, alguém lhe responde.

- Eu quem? Torna. – A Morte sou.

Um vulto que bem sabia

Pela mente lhe passou:

Esqueleto armado de foice

Que a mãe lhe um dia levou.

Guardou-se de abrir a porta,

Antes ao leito voltou,

E nele os membros gelados

Cobriu, hirto de pavor.

Mas a porta, manso, manso,

Se foi abrindo e deixou

Ver – uma mulher ou anjo?

Figura toda banhada

De suave luz interior.

A luz de quem nesta vida

Tudo viu, tudo perdoou.

Olhar inefável como

De quem ao peito o criou.

Sorriso igual ao da amada

Que amara com mais amor.

- Tu és a Morte? Pergunta.

E o Anjo torna: - A Morte sou!

Venho trazer-te descanso

Do viver que te humilhou.

-Imaginava-te feia,

Pensava em ti com terror...

És mesmo a Morte? Ele insiste.

- Sim, torna o Anjo, a Morte sou,

Mestra que jamais engana,

A tua amiga melhor.

E o Anjo foi-se aproximando,

A fronte do homem tocou,

Com infinita doçura

As magras mãos lhe cerrou...

Era o carinho inefável

De quem ao peito o criou.

Era a doçura da amada

Que amara com mais amor.